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O Eterno disse a Abrão: “Sai da tua terra natal e da casa de teu pai para a terra que eu te mostrarei. Farei de ti uma grande nação, E te abençoarei; Vou engrandecer o seu nome, e você será uma bênção. Abençoarei aqueles que te abençoarem E amaldiçoarei aquele que te amaldiçoar; E todas as famílias da terra Se abençoarão por você. ” (Gênesis 12: 1-3)
A terceira porção da Torá inicia com a grande promessa, a aliança feita entre o Criador e Abraão, nosso pai. O convite para que o patriarca deixe a terra de seus pais para ir em direção à terra prometida dá início à grande saga do nosso povo, que se inicia com Abraão e segue até os dias atuais. Relata a Mishná que Abraão enfrentara uma série de provações, vencendo-as. O Pirke de Rabbi Eliezer contou essas provações como os dez julgamentos.
O primeiro ocorreu quando Abrão era uma criança e todos os magnatas do reino e os mágicos tentaram matá-lo. A família de Abrão o escondeu em uma caverna por 13 anos, durante os quais ele nunca viu o sol ou a lua. Depois dos 13 anos, Abrão saiu falando a língua sagrada, o hebraico, e desprezou os ídolos e considerou abomináveis as imagens de escultura, e confiou em HaShem, dizendo: “Bem-aventurado o homem que confia em Ti”.[1]
O segundo, quando ele foi colocado na prisão por dez anos e lançado na fornalha de fogo de Nimrod. Abrão foi colocado na prisão por dez anos (três anos em Kuthi, sete anos em Budri). Após 10 anos, eles o tiraram e o lançaram na fornalha de fogo, e D’us o livrou da fornalha de fogo, e, por isso, se diz: “E Ele lhe disse: ‘Eu sou o Senhor que te tirou da fornalha dos caldeus”[2] e ainda nos profetas, onde se lê:“Tu és o Senhor, que escolheu Abrão e o tirou da fornalha dos caldeus”[3].
A terceira foi sua migração da casa de seu pai e da terra de seu nascimento. HaShem o trouxe para Harã, e lá seu pai Terah e Athrai sua mãe morreram. O Pirke de Rabbi Eliezer ensinou que a migração é mais difícil para um humano do que para qualquer outra criatura. E o Criador chega a Abraão e diz: “Sai”. Rashi ensina que as palavras Vá embora/sai (לֶךְ-לְךָ֛) significam literalmente “ir para você”, ou seja, vá para seu próprio bem. Abandonar sua terra, sua língua, seus costumes, seus parentes e amigos, de fato, não é uma missão fácil, mas necessária. E isso se somou à fome pela qual passou nosso patriarca, à tomada de Sara, sua esposa, para ser esposa de Faraó, à tentativa de assassinato, quando o reis vieram contra ele para matá-lo, às dificuldades da circuncisão na idade adulta e avançada, pois Abraão já tinha 99 anos, quando isso se deu, à expulsão de sua escrava e de seu filho a mando de sua esposa e, por fim, ao sacrifício de Isaac.
Lech Lechá (לֶךְ-לְךָ), duas pequenas palavras, quatro letras, mas que tragédia na vida de um homem! O sair de Abraão altera toda a ordem de sua vida, todos os seus planos e o destino de toda a humanidade e sua aceitação dá início à história milenar do nosso povo.
Rabi Berequias ensinou que antes de o Eterno chamar Abrão, Abrão parecia um frasco de mirra fechado com tampa bem justa e deitado em um canto, para que sua fragrância não fosse disseminada. Assim que o frasco foi recolhido, entretanto, sua fragrância foi disseminada. Da mesma forma, o Criador ordenou a Abraão que viajasse de um lugar para outro, para que seu nome se tornasse grande no mundo. O Midrash Bereshit Rabá 39,2 compara Abraham Avinu a um frasco de um delicioso perfume que estava escondido. E desde que ele sai de sua terra, percorrendo diversos lugares, esse cheiro se espalha por diversos lugares para que todos pudessem se deleitar com seu aroma. “Seus unguentos têm uma fragrância agradável”.[4]Abraham, que estava cheio de boas ações e belíssimas virtudes, tinha que abandonar a pátria para que sua fama e seus ensinamentos se tornassem conhecidos no mundo inteiro.[5]
Rabi Phinechas comentou em nome de Rabi Hoshaya que o Eterno disse a Abraão para seguir em frente e trilhar um caminho por seus filhos, pois tudo que está escrito em relação a Abraão está escrito em relação a seus filhos[6]. Se Abraham passou pela fome, também o povo por ela passou. Se Abraham desceu ao Egito, também assim o fez o povo. Se a Abraham tentaram assassinar, também ao povo tentaram exterminar.
De fato, isso é visto ao longo da nossa história. E essa tragédia da mudança, do sair da terra em que estamos, do Lech lechá, não findou no nosso patriarca, mas nos perseguiu ao longo da história. Quando nossos antepassados, assim como Abraão, já possuíam negócios, língua, moradia, parentes e estrutura estabelecida em Portugal, nos idos de 1500, foram acusados de serem a causa de uma seca, da fome e da peste que assolavam aquele país, também eles ouviram soar o brado do LECH LECHÁ. Eles já haviam ouvido esse “sai desta terra” quando os reis católicos os expulsaram da Espanha, no final de 1400.
Nosso povo já havia sido convertido forçadamente naquele país, mas, certo dia, dia 19 de abril de 1506, no Convento de São Domingos de Lisboa, um domingo, quando os fiéis rezavam pelo fim da seca e da peste, alguém jurou ter visto no altar o rosto de Jesus iluminado, um milagre aos cristãos atribulados. Ora, aquilo só poderia ser um sinal de conforto de Jesus aos seus fiéis. Um judeu, agora cristão-novo, que também participava da missa, tentou explicar que aquilo que o povo estava pensando ser um milagre era apenas o reflexo de uma luz, mas foi calado pela multidão, que o espancou até a morte. Deu-se início ao Massacre de Lisboa.
A partir daí, os judeus da cidade que anteriormente já eram vistos com desconfiança tornaram-se o bode expiatório da seca, da fome e da peste: três dias de massacre se sucederam, incitados por frades dominicanos que prometiam absolvição dos pecados dos últimos 100 dias para quem matasse os “hereges”.
A corte encontrava-se em Abrantes — onde se instalara para fugir à peste — quando o massacre começou. D. Manuel I tinha-se posto a caminho de Beja, para visitar a mãe. Teria sido avisado dos acontecimentos em Avis, logo mandando magistrados para tentar pôr fim ao banho de sangue. Entretanto, mesmo as poucas autoridades presentes foram postas em causa e, em alguns casos, obrigadas a fugir.
Homens, mulheres e crianças foram torturados, massacrados e queimados em fogueiras improvisadas no Rossio, mais precisamente junto ao largo de São Domingos. Os judeus foram acusados entre outros “males”, de deicídio e de serem a causa da profunda seca e da peste que assolava o país. A matança durou três dias — de 19 a 21 de Abril, na Semana Santa de 1506. Um dos alvos principais do massacre foi um judeu, agora cristão-novo, que era escudeiro do rei, D. João Rodrigues Mascarenhas, sendo este também detentor de muitos direitos de alfândega nos principais portos do reino (Lisboa, Setúbal, Porto e Viana).
No seguimento do massacre, do clima de crescente antissemitismo em Portugal e do estabelecimento do Tribunal do Santo Ofício — que entrou em funcionamento em 1540, perdurando até 1821 — muitas famílias judaicas fugiram ou foram expulsas do país. Tendo como destino principal os Países Baixos e secundariamente, França, Turquia e Brasil, entre outros.
Mesmo expulsos da Península Ibérica, os judeus só podiam deixar Portugal mediante o pagamento de "resgate" à Coroa. No processo de emigração, nossos antepassados abandonavam ou vendiam as propriedades por preços irrisórios e viajavam apenas com a bagagem que conseguiam carregar.
Rabi Berequias observou que em Gênesis 12:2 HaShem já havia dito: “Eu te abençoarei”, e então acrescentou dizendo, “e você seja uma bênção”. Rabi Berequias explicou que HaShem estava transmitindo a Abraão que, até aquele ponto, O Criador era quem tinha que abençoar o mundo que Ele havia criado, mas depois disso, Ele confiou a habilidade de abençoar a Abraão, e este poderia, a partir de então, abençoar quem quisesse.
Rabi Eleazar interpretou as palavras: “E em ti as famílias da terra serão abençoadas (וְנִבְרְכוּ, venivrechu)”[7]para ensinar que o Eterno disse a Abrão que enxertaria dois bons brotos em sua família: Rute, a moabita e Naamah, a amonita. E Rabi Eleazar interpretou as palavras “Todas as famílias da terra” para ensinar que até mesmo as outras famílias que vivem na Terra são abençoadas por causa de Israel[8]. E assim tem sido ao longo dos milênios.
Por todos os lugares do mundo pelo qual passamos, temos cumprido a promessa de sermos uma bênção, levando desse perfume moral, levando desse perfume intelectual de nosso patriarca e, apesar de tantas perseguições, também muitos não-judeus, os piedosos dentre os povos, têm reconhecido essa força de nosso povo, como demonstra o discurso de Miguel de Unamuno, em 1935, na cidade de Córdoba, por ocasião do 750º aniversário de Rambam: “Em 1492, os israelitas da Espanha viram-se forçados a abandonar esta terra, e hoje nós vos pedimos: voltai à nossa terra, à terra que tanto vos deve.” E ainda, as palavras de Ricardo Jorge, no prefácio ao livro de Samuel Schwarz, Os Cristãos novos do Séc. XX em Portugal:
Nunca o Leão de Judá alçou tanto as falcadas garras e sacudiu com tanta altivez a juba; nunca a raça dispersa, oprimida e perseguida do judeu errante avançou assim à boca da cena do mundo no poderio da ação social e na preocupação espiritual da humanidade. Ruiu há tantos séculos o templo de Herodes o Grande, mas a Torá emblemática, em vez de esmaecer, resplandece, e a sarça ardente do Monte Horeb, em vez de se consumir, recresce em línguas de fogo que bradam e alumiam o nome sempre sagrado de Moisés. (...) Judá domina pela estesia religiosa que de si expandiu, e domina até pelo dom da mentalidade, como se o judeu medisse o escalão mais avançado da capacidade cerebral. Intervém com preponderância econômica na circulação de riquezas, como intervém com ascendente intelectivo na circulação de ideias – exemplar súbito do homo economicus e do homo sapiens. Leroy-Beaulieu dá por fato assente que os seis ou sete milhões de judeus da Europa produziram relativamente mais homens de talento que os trezentos milhões de cristãos; e que há três ou quatro vezes maiores probabilidades de encontrar uma personalidade distinta, um sábio ou um artista, entre mil judeus do Ocidente, do que entre mil ingleses, franceses, ou alemães. Ensinou outrora letras, ciência, medicina e filosofia ao europeu bárbaro, e quantos luminares procedentes da grei não balizam como faróis a estrada do progresso. Espinosa, luso-hebreu, orienta primacialmente a especulação metafísica e filosófica; Einstein consubstancia genialmente numa síntese assombrosa a conceituação dinâmica do universo. Em plano subjacente, as congeminações psicanalíticas de Freud, embora arriscadas e discutidas, trazem agora à roda as testas pensantes.
Que possamos seguir levando o perfume da Torá, da sabedoria, da moral, como luzeiro aos quatro cantos do mundo, sem nunca nos olvidar o motivo pelo qual, Abraão nosso pai, saiu da terra dos caldeus em direção a Israel: “Avram Avínu, padre kerido, padre bendicho, Luz de Israel”!
[1]Salmo 84:12
[2]Gênesis 15: 7
[3]Neemias 9: 7
[4]Cântico dos Cânticos 1:3
[5]Bereshit Rabá 39,2
[6]Bereshit Rabá 40,6
[7] Gênesis 12:3
[8]Yevamot 63a
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